Miguel Ângelo

Quem sou eu

segunda-feira, julho 10, 2006



Calores obstinados não paravam de entrar e sair, rodopiavam, ensurdeciam as luzes da rua João. Humedeciam-se os panos que tinha debaixo, por cima, por baixo, eram gotas ousadas que te roubavam o destino, que esfregavam no corpo que o teu corpo jamais não quis, que preenchiam milésimas falhas da superfície humana, inundavam as concavas formas presentes.
Intermitente era vida no escuro da minha vista, era escuro e partimos da impossibilidade da definição desta cor, era escura, e os meus olhos eram verdes. Nas horas absurdas golpeadas a pregos os meus olhos seriam verdes, como nas outras em que a cor se mantinha. Estes no escuro fechavam e viam o que era, eras, viam abertos o escuro do tempo, de qualquer forma uma esfera deformada e peluda encarrega-se de não saíres de mim, o meu corpo lembra-se e tu entras em mim de novo, suscitam-se dores e louvores clareados por manchas, de lado, enrolado, por baixo e por cima, os lençóis recordavam a agitação, humedeciam-me mais, cobertos de funcionalidade.
Contorcia-me, retorcia-me, e a vizinha do quarto andar nunca me vinha à cabeça, destorcia-me acentuava-te, e nem o senhor louvado me vinha cabeça, somente me veio a força da tradição à boca: AI meu deus!!! Senhor!
Para lá da névoa requintada e escurecida ao rodar dos ponteiros, a íris focava o impossível, juntamos os pés às palavras sem tradução, as mãos, os dedos do pequeno ao maior, o devaneio rompia os violinos da cidade romana e nem o medo me fazia tremer.
O pescoço não limitava o seu eixo e esticava ao invés das veias subentendidas, tapadinhas de letras, embriaguezes e explosões animalescas. O meu ombro reluz, com a luz que não encontro nem procuro, o teu ombro existe, na minha grafia mental tu existes demais, vens e vais como o calor que tenho que não larga nem desunha o poder que me incita. Vem debaixo do corpo, elevo espontaneamente o umbigo, levo as costas comigo e não toco nos invasores humedecidos, a palmas dos inferiores suportam transportam importam, invocam a queda do todo. “Continuam ousados os rios de bafos”.
O escuro abraça-me tu dás-me cabeçadas os cabelos caem de tantos pontos fuga o lábio superior cobre o debaixo os dentes rasgam a pele o sangue espirra sem cor a perna estica sem ordem o rabo sai da formatura o olhos esmagam as pálpebras as pupilas gritam de pressão as persianas caem do abanão e floresceram de cores as cidades do mundo.

Miguel Ângelo