Miguel Ângelo

Quem sou eu

quinta-feira, dezembro 21, 2006


Perdi o luxo da melhor cena.
O banco lá debaixo ainda reluzia as formas mistificadas da noite, sentia-se o gelo das pedras e a presença animal parecia faminta, o cesto que a menina do laço vermelho deixou cair na tarde passada apresenta-se intacto e estupefacto. As guitarras que não existem parecem tocar, as folhas parecem ouvir, os troncos rebaixam o solo com o peso rude e disformado. As linhas da ponte cinzenta queriam mergulhar no rio, são extensas e por mais tensas que sejam não deixam de se molhar, o molho de relva regado jamais enfrentaria a cor da circunstância, o prédio daquela avenida que não vejo está em remodelação constante, e as esquinas da cidade neste momento, parecem arredondar-se.
O velho de olhos pingados e pés regelados banhado no escuro das cores alimenta o seu desespero em cartões e trapos colhidos, a neve estar distante parece a prancha de um sorriso seu, o velho padeceu. Para alem do vidro existe um corpo que ele resiste culpar, rebaixa a revolta e procura o toque favorável.
O olhar parece desperto às batidas naturais, são sequelas de incapacidade. Baixo o queixo num acto de desespero interno, rasgo o estômago com as lágrimas e antes de sangrar…caiu a pasta do cimo do balcão. Ás vezes pintamos vida e os objectos aparentemente banais tornam-se assustadores. Repus a mancha e voltei ao tempo, uma bolsa aveludada sustenta-se nas mãos, o tecido envolve-se nas formas brilhantes e vincadas das potências, abre-se, e o chão parece comer diamantes. Cada pedra um espelho diferente, uma cama de bicos para quem sonha dormir, gélidos.
Voltei ao quarto onde as paredes se pronunciavam, te pronunciavam. Abri a torneira num acto inquieto, um banho de espuma e vapores subtis, um olhar seco ficou colado no tecto. Não oiço o eco das minhas distracções… Na cama o dueto inquieto parecia continuar, as paredes voltavam aos pormenores, o mundo, girava em dois corpos viajantes invasores de lugares inalcançáveis, os lençóis deslizavam de vergonha até o chão permitir, e a minha lembrança, é isso, não passa de lembrança.
Não voltaste e a tua sombra ainda passa no meu espaço, e num espaço tão curto fomos tão ágeis. Trituramos de modo feio as letras que mais ninguém tinha, e o privilegiado acaba por não ser ninguém. Talvez não entenda os diamantes espalhado na minha superfície, ou entenda porque se espalham, tu unia-los tão bem. Podíamos dançar para sempre como naquele dia, as guitarras existiam. Continuamente honrado guardei a tua voz, aquilo que devasta o luxo da minha cena.



Miguel Ângelo

quarta-feira, novembro 01, 2006



Abri as portas de madeira que imploravam por uma bebida já negra e banal,
A casa tremia repleta e arrepiada,
O vento corria de lado e de frente
O vento continuava entranhando-se em qualquer ranhura, nervura, buracos e aventura.
As portas abriam mais que o pedido, abriam a boca, o nariz, o ouvido…
As portas cantavam as notas que não tinham cifrões,
Os gatos miavam,
As portas fechavam,
Os gatos miavam tufões.

Abri as portas de madeira mais do que tinha pedido,
Era a força e a vontade,
Era o corpo farto,
Era estar vestido.
O chão transpirava de medo,
E o medo
Caía sobre ele escorregando pelas entranhas que o vento esculpia.
Espalhei o suor pelas paredes mais próximas,
De seguida limpei a cama com os olhos enquanto o disco rodava a velocidades alucinantes,
Até que saltou da casa giratória
E eu continuei a limpar.
Sentiam-se as queixas e agradecimentos do conjunto insólito ao cair da noite,
O tecto arrepiava-se e de repente ficava bicudo,
Apagamos o tecto e voltamos ao corpo e ao disco.
E o disco e as pernas já eram felizes, as notas sorriam, lacrimejavam ao ritmo pretendido,
O corpo ia deixando a cama e a limpeza,
Beijei o ombro e o sinal de esperança,
Foquei o alvo destino de um rasgar lento e subtil,
E fui rasgando o nipónico acento, esbanjador de tardes inúteis na contemplação de uma parede bolorenta.

Abri a porta de madeira que pingava um infindável som de sede inesgotável.
Passei por entre as pernas da senhora construção,
Mudei de amor e divisão.
Mudei de sede e senti os dedos rogados.
Era o decorrer de um filme hidráulico mesmo na ponta do meu nariz,
Um mergulho destemido impulsionado por um desejo de viajar inconstante levou-me a suster um terço da respiração,
O folgo era pouco.
O corpo não.
Agora saía do filme e a superfície claramente não terrificada era regada como as alfaces.
Pelo caminho - (As alfaces são historicamente associadas à impotência masculina, e simbolicamente associadas à morte, tudo porque:” Na mitologia Grega, a história de amor entre a deusa Afrodite e o jovem Adonis teve um fim dramático quando esse último foi morto por um porco selvagem no jardim das ALFACES no qual ele estava escondido.”)
E o meu impulso regando as alfaces?
Vestimos todos a Grécia, compramos órgãos sexuais masculinos e no esconderijo perfeito delineado com muito amor chamamos com impotência o sofrimento da morte não correspondida.




Abri uma porta de madeira que se arrastava de boca tão seca,
E não tinha terra colada nos pés.
Peguei nas tesouras insofridas e recortei os cabelos maiores,
Os bigodes dos gatos,
As unhas e os dedos, os bicos do tecto,
A roupa e o corpo,
Até o pouco das pestanas que tinha.
Mudei as setas das nuvens da casa,
A casa era o fumo da timidez da grande noite.
A noite que começara desta forma e viria a terminar com um insólito e requintado café preto.



Miguel Ângelo

domingo, outubro 22, 2006

Ontem as cores sumiam de medo,


hoje não há modo...

Miguel Ângelo





terça-feira, setembro 12, 2006



Um Mundo primitivo e virgem,

Onde os filhos são criações artísticas,

Obras vulneráveis,

Reacções destemidas ao ponto de enfrentarem a natureza.

Não terei de esperar tempo algum,

Sou progenitor da cria mais poderosa.


Miguel Angelo







segunda-feira, julho 10, 2006



Calores obstinados não paravam de entrar e sair, rodopiavam, ensurdeciam as luzes da rua João. Humedeciam-se os panos que tinha debaixo, por cima, por baixo, eram gotas ousadas que te roubavam o destino, que esfregavam no corpo que o teu corpo jamais não quis, que preenchiam milésimas falhas da superfície humana, inundavam as concavas formas presentes.
Intermitente era vida no escuro da minha vista, era escuro e partimos da impossibilidade da definição desta cor, era escura, e os meus olhos eram verdes. Nas horas absurdas golpeadas a pregos os meus olhos seriam verdes, como nas outras em que a cor se mantinha. Estes no escuro fechavam e viam o que era, eras, viam abertos o escuro do tempo, de qualquer forma uma esfera deformada e peluda encarrega-se de não saíres de mim, o meu corpo lembra-se e tu entras em mim de novo, suscitam-se dores e louvores clareados por manchas, de lado, enrolado, por baixo e por cima, os lençóis recordavam a agitação, humedeciam-me mais, cobertos de funcionalidade.
Contorcia-me, retorcia-me, e a vizinha do quarto andar nunca me vinha à cabeça, destorcia-me acentuava-te, e nem o senhor louvado me vinha cabeça, somente me veio a força da tradição à boca: AI meu deus!!! Senhor!
Para lá da névoa requintada e escurecida ao rodar dos ponteiros, a íris focava o impossível, juntamos os pés às palavras sem tradução, as mãos, os dedos do pequeno ao maior, o devaneio rompia os violinos da cidade romana e nem o medo me fazia tremer.
O pescoço não limitava o seu eixo e esticava ao invés das veias subentendidas, tapadinhas de letras, embriaguezes e explosões animalescas. O meu ombro reluz, com a luz que não encontro nem procuro, o teu ombro existe, na minha grafia mental tu existes demais, vens e vais como o calor que tenho que não larga nem desunha o poder que me incita. Vem debaixo do corpo, elevo espontaneamente o umbigo, levo as costas comigo e não toco nos invasores humedecidos, a palmas dos inferiores suportam transportam importam, invocam a queda do todo. “Continuam ousados os rios de bafos”.
O escuro abraça-me tu dás-me cabeçadas os cabelos caem de tantos pontos fuga o lábio superior cobre o debaixo os dentes rasgam a pele o sangue espirra sem cor a perna estica sem ordem o rabo sai da formatura o olhos esmagam as pálpebras as pupilas gritam de pressão as persianas caem do abanão e floresceram de cores as cidades do mundo.

Miguel Ângelo

quinta-feira, junho 22, 2006

(Aconselho, para uma leitura mais sabora o acompanhamento da música Cheers Darlin de Damien Rice)

Entre pedaços de chuva e linhas amanhecidas desertamos o corpo e unimo-lo a um sossego secular. Encostamo-nos ao mar…a circunstância crescia com o sol, e o silêncio parecia afastar-se com o beijo da gaivota, com a espuma importada dos confins, confins sagrados de certo.
Formamos figuras à sombra do mar, do ar, entramos na palavra saudade. Ininterruptos são os deslizes que temos no tempo, são promessas douradas.
Trespassam rumores do primeiro homem, “ amor foi, é, são “, desordens na fúria do sangue, um bosque de vento perfeito. Lentamente beijamos o mar, beijamos o suficiente para as pedras voltarem…
Miguel Ângelo

domingo, junho 11, 2006



Ruas inteiras caem sobre mim, caem as luzes,
As folhas,
Pedaços de corpo vão caindo,
Desmembramentos contínuos.
Caía o rosto,
O resto…

Miguel Ângelo

domingo, maio 28, 2006

Antes de Hoje



Eram pequenos os passos, pequenas as pernas, pequenas para chegar onde os outros chegavam. Pequeno era também o rosto, que já em posse de olhos grandes e inocentemente selvagens, chegava à noite coberto de manchas, poeiras cheias de jogos, cheias de ouro criança.
Chegaram as horas da lua, e pelo que me contam nunca gostei que as horas não fossem minhas, parece que já pequeno queria protagonismo, era ciúme impulsivo (digo eu). Esta mesma noite passeava de mão dada com um crescido, era assim que dizia, um crescido que devia rezar para que não lhe fizesse mais perguntas, não me lembro quem era, talvez me lembre que a sua voz era suave e temperada, a pele da mão seria maçã, e a sua explicação do fenómeno estrelas ficou-me sempre. Eram desejos realizados, cada estrela era um desejo pedido e realizado, não me recordo, mas devo ter pedido algum para que houvessem mais estrelas. Que brilho louvável, tomara que fossem desejos.
Neste dia o sol nasceu alentejano, era a casa cheia de quartos e janelas que avistavam aqueles bichos imundos de nome vaca, eu lembro-me que também haviam coelhos, esses sempre soube o nome e alguns cabiam-me na mão, alguns também me deixaram em recordação um desabafo, uma mijadela no calção. Neste dia o sol também custou a morrer, o cão é que parecia frágil, passo a explicar: o sol já se punha e estavam todos rendidos à recolha das batatas, uma maçada portanto, eu era pequeno e essas brincadeiras não me persuadiam, antes persuadissem. Estava eu de volta da carroça de madeira que o cavalo já tinha largado, haviam sacas, restos de palha, e outras sujidades campónias com certeza, o que não era suposto estar por lá era uma caçadeira (sei hoje o nome), daquelas que o meu avô usava para apanhar passarinhos, coitados. Eu em jeitos de brincadeira e mistério lancei as mão aquela cruel criação, lá estava eu a observá-la como se fosse um dos meus brinquedos, sim, porque os meus brinquedos permaneciam nas prateleiras a chamar o pó (hoje dou por mim a vê-los sem uso), e sem me lembrar de como nem porquê, ouviu-se um estrondo e eu fui impulsionado para traz. Agora volto a dizer,” o cão parecia frágil” depois de um ganir pungente, deitava sangue da pata, tu eras-me querido Moceto.
O sol custou a morrer, o Moceto também, mas este momento nunca morreu da minha lembrança. Eu sei que todos interromperam a celebre apanha das batatas, sei também que gritava assustado e que sermões se anexavam ao drama.
Um dia não são vidas, e uns tempos depois já comia melancia, mesmo temendo que a minha pequena barriga pudesse rebentar com o crescimento de novas como dizia o meu avô. Reforçando o pensamento, provavelmente só cresceriam novas melancias se eu engolisse alguma das muitas pintinhas pretas. Eram as fatias gigantes que o meu avô cortava com a sua navalha de madeira tipicamente alentejana que me derretiam o sol acampado no corpo, que pregavam a sede bem longe de mim, frescas tardes de verão passadas na cadeirinha de verga a comer melancia ouvindo historias d´avó Naiça, assim pronunciava eu o Nome Inácia da minha bisavó que trazia sempre com ela uma bagagem de imaginação cheia de cores e animais, eu ainda me lembro do “Toiro Azul”.
O calor não me limitava, pois a praia também me chegava aos olhos, talvez preferisse que não chegasse mais perto que os olhos, as vozes de hoje que puxam passados contam-me que a birra era por não ter meias, os meus pés nas areias, não era boa combinação. Abre-se a boca e correm as lágrimas do célebre crocodilo, assim era o meu descontentamento ao ter que sentir os grãozinhos de areia a perfurarem ou trespassarem-me os pés, pior era depois de molhados, aí queriam-se sossegados na toalha sem pinga de grão colado na pele. Falando em pingas, ainda hoje me pergunto a causa das pingas caídas dos olhos de minha mãe. Uma noite em que o escuro não se calava na minha cama, arrefeço os barulhos que ouvia com o pousar da minha atenção sobre a porta do quarto. Eram raspões de voz, era uma inconstante projecção fonética que me enleava o novelo humanizado, era voz de minha mãe que saltava, talvez o meu coração saltasse com as palavras para deixar esta nódoa, talvez as pingas que ouvia cair-lhe do rosto não fossem salgadas.

Miguel Ângelo

quarta-feira, maio 17, 2006




Os sentimentos envolverse-ão numa onda de luz e

mancharão os dias de claridade.

Esta, sugará todas as palavras que não conseguimos dizer,

deixará no peito de cada especial um mundo que não escapa,

um novelo de gostos com sabor a existência...

quinta-feira, abril 13, 2006

É de mim a sugestão que diz que o texto fica muito mais delicioso ao som desta celebre música.
Ao som de Keith Jarrett - Smoke Gets In Your Eyes




Sacolejavam as folhas mal postas no centro da casa,
Sacralizavam-se as ripas de madeira já velha,
Atarraxavam-se os lençóis que pusera no varão provisoriamente,
Descoordenadamente sussurravam os ponteiros da prateleira do quarto, ponteiros que um dia achara nas bermas do tempo,
Praguejava o vento por debaixo das frágeis e antigas janelas, algumas que alguém marcara os gritos do sol,
O bicho do artista de cima fugia de rompante ao audível som que fizera a vassoura ao cair,
Ressonam veludos que forram e peneiram este cadeirão da sala, este que encandeara o clima neutro da casa, banhado nos cinzentos d’Inverno, com vermelhos garridos variados na sombra, que faço e fizera vastamente.
Se eu não me instalasse, eu não amolgara a brilhante esponja que sinto afundar, eu não viajara, sentira, muito menos respirara miseravelmente sozinho. Deixei-me ficar massacrado em pormenores, bagagens perpétuas, petulantes souvenirs.
Se eu daqui proviesse, eu não recordara naufrágios carnais, nódoas escritas, impulsos raiados em negro, não recordara os vultos que sofrem, me assombram, arrombam as portas que restam.
Instalei-me no acento contraste, agora sim, sou contraste à multidão. Os membros pendem sobre o tecido e a luz recordara um efeito tenebroso, o vento arrepiara-me o corpo e o bicho do artista percorre-lhe as rugas …



Miguel Ângelo

segunda-feira, março 20, 2006



Perdi-me ao contrário,
é pra não ser sempre da mesma forma,
perdi a norma.
Perdi-te ao contrário.
Ao contrário das outras perdas minimalistas,
das outras pedras, merdas...
Por de traz dos meus olhos a luz é complexa,
a luz é perversa ao ponto de se instalar.
É às cegas que digo eternamente que fui,
é às surdas que vejo.
Rodei-me contra ao vento sem meias nem pedais,
foi nua a ideia das veias reais,
foi crua (ideias mortais).
Lancei-me do alto da consciência e a queda não perdoou,
Vivi ao contrário.


Miguel Ângelo

domingo, março 05, 2006



Juro que anseio a colagem de nós,
Que quero que digas que o tempo é só nosso,
Que os homens se perdem e se morrem p’ra outros felizes.
Que as pernas se cruzem e deixem migalhas que brilham,
Que as pernas se cruzem e façam explodir.
Partam o azeite que me enjoa o caminho, te enjoa,
Que unam talheres a uma refeição desejada. Temperos de sempre,
Dissabores.

A janela do meu quarto já não abre igualmente, cada porta molhada mede mais que as que secam,
Cada cama que molho são pedaços de ti,
São pedaços de luz que a janela me rouba,
São pedaços de escuros caindo, nevando no corpo que deixas.
Quando me acordo já não sei voltar,
Já não me lembro do sol,
Já só recordo a primeira vez.
Quando te acordo, vejo e beijo a delicia do mistério,
Vou ao fundo saciado no sonho,
Encontrei-o no culto do sono,
Foram risos de esperança,
Lembranças ambíguas à saudade.

Minutos de segredo nos dedos que tenho,
Não venho p'ra sempre nem p'ra outro bocado,
Venho p'ra vida que tenho nos olhos,
Nos teus olhos.

Depois de saber onde estou,
Perdi-me.
Lembrei-me do longo, langa, lenga, de amor que envolvo por ti.
Lembrei-me do BUM BIM BAM daquilo que senti.
Eu sinto a minha hora passada, sinto que passas e que me passaste,
Roubaste.
Corta-me setas que enleio,
Corta-me muito mas cola-me demais.
Cola-te a mim.
O teu passo está tão longe do meu,
Mas o corpo resolve e formamos segredos.
São coisas complicadas as que vejo por ti...

No dia que não me faltares...
Não voltes.
És o contrário de nada... Porque as palavras são difíceis.





Miguel Ângelo

quarta-feira, março 01, 2006



Hoje vi-a...
Saída de uma carruagem dita transportadora de cidadãos, sai alguém que não tem, que não quer, que não vem.
Era ao longe sombra larga, mexida, sambando enchida de sacos, maletas disparatadas, companhias compradas p’ra disfarçar a solidão. Aproximando-se em saltos, em sons coordenados, vem saindo da sombra gargalhando alegria, despejando euforia, despejando conversa com sofás descartáveis, com lugares insufláveis furados ao pormenor.
Venho eu recheado, "perseguido" a pedido, misturado em sabores que todos queriam provar. Sabores dos loucos, suaves, olhares reluzentes sobrepostos aos mundos que dizem ser terceiros, expressões afundadas aos andantes vulgares, saídas aos deuses, deslizam criadas em corpos "perfeitos".
Eu vejo-a direccionada ao meu corpo anoitado, lá vem ela aluada, ensacada, engraçada querendo palavras saltando em cetim.
Cá está ela de passagem e a conversa vem fluir:

- Hahahaha (ri de boca cheia inclinando-se para traz. Vem cheia de sacos, sentindo-se estrela, é ela.)
- Não quer uma ajudinha? (diz meu corpo solidário)
- Respondeu que já comeu, já comeu tudo muito obrigado.

Mas que bela que está ela, reparei eu ("senhor. Romeu" de barba falsa) bem estonteado. A "menina" já rogada se encontrava em grande estado, demais pintada p’ra seu rosto, de lábio fino e batôn sobreposto. Falando no olho há muito a contar, é curto e escuro portando carência, iludindo o destino arrastando vivência. De pálpebra fina, curtinha, traquina seu olho é pintado de azul carregado, bem vasto e voado pelo rosto esbranquiçado em pozinhos de arroz.
Sobrancelha escurecida, acrescentada ao exagero, é ela viva ao seu tempero. Falei de novo a este povo:

- Onde vai dona pimpona, tão alegre e brincalhona, diga lá dona mulher, vai pintada e apressada à procura do que quer?
- Tenho um bar meu amiguinho, eu vou lá, vou lá eu, vou lá dançar amor do céu... (diz-me contente, sorri sem dente fazendo rir com pressa dir.)
- Nós vamos lá, Vemo-la cantar, vemo-la dançar, prometemos ir vê-la e faze-la actuar. (digo eu feito "Romeu" vendo ilusão naquele olhar, nas palavras vindas em choro)
- Haaa...ho000...hahah...nããããããooo (misturando expressões dando a volta a sensações p’ra tentar ler o que se vai ver) 1, 2, 3, 4... 6, iiiiii, são muitos, são bastantes....e então os meus restantes? (diz ela arrepanhada que os restantes da ninhada enchem tudo de empreitada)
É pequenino...é só meu... já não cabe amigo meu. Eu tenho pressa meu menino, até à vista, obrigadinho. Ahahaha (lá vai rindo, vai gingando conforme os anos, vai sonhando noutros planos pra que o mundo pareça melhor).
- Adeus adeus minha senhora, foi um prazer vê-la falar (já fui seu fã neste lugar. Lá vai sumindo pra outras sombras, subindo magia à vida fria que lhe deram a querer, a comer, a ter fome...)

O seu Cabelo era amarelo, era arame duro e pronto para que o próximo tonto viesse cheirar, mexer p'ra se picar nas formas longas e enroladas que a fazem ter e ser criada(s) no tempo outro que ninguém tem.
Impressionante é ver "amigas" destas que em plena guerra vivem festas, de cores nobres em florestas de chocolate e algodão.
Hhhaaaaaai...é de cartão a solidão,
A ilusão...




13.11.2005
Miguel Ângelo

sexta-feira, fevereiro 10, 2006






Aos cantos do mundo o eixo dispara.
São gritos guardados nos braços do céu,
Pedaços de corda louvados em verso.
Soluços amargos,
Engole.

Enroles uivado na sombra da carne,
Heranças no sangue.

È grande o Inverno que ensopa as palavras,
Risquinhos gelados que rodam gigantes
Como dantes os ventos rimavam,
Como dantes as portas abriam e o sorriso era menos criado,
Instinto falhado nos tempos de agora.

Aos cantos do mundo amachucam-se vidas.

São choques presentes no saco de embalo,
Balanços pingados aos poros caídos.
São quedas constantes na bolha envolvente.

Envolve-te.
Miguel Ângelo

sábado, janeiro 28, 2006






...olhar animal,
transtornos públicos,
prazeres secretos...
Miguel Ângelo

domingo, janeiro 22, 2006






Viva aos soltos da rua pormenor...
Passeios galgados que sabem a mais,
mais vidas escritas, inscritas...

Miguel Ângelo

sábado, janeiro 14, 2006



Alucinado criei-me…

Corri então aos cantos que vejo,
Rompi de vês paredes bizarras…

Mudei de casa e os lençóis eram outros,
Já não vejo bichinhos voantes no tecto,
Não vejo brinquedos colados em loucuras aparentemente sonoras,
Dentadas por cima dos dedos que banalmente costumam falhar…
Hummmm….
Fiozinhos brilhantes em volta do corpo
Passantes às curvas da carne divina,
Que vulto excitante.
Badala desejo…
Agora o tempo ressona.
Delirei ameaças aos ponteiros que rodam,
Delirei sufocos repetidos,
Inesgotáveis…
Juro que mato essa coisa que espia.
Agora que o espelho recita poemas,
Agora que vejo fiozinhos brilhantes que pegam e enrolam dois corpos de céu,
Que pegam e enrolam um corpo mais eu,
Que pegam e enrolam meu corpo no teu…
São pedaços nutridos do mesmo,
Detalhes incontáveis. . . .

Miguel Ângelo

terça-feira, janeiro 10, 2006



São entulhos ouvidos ao monte,
De fonte partida em barulhos,
Mergulhos.
Estes que oiço por de traz da porta cortam raciocínios riscados em eficácia,
Cortam cruzes demais esperando luzes em recompensa real.
È anormal,
Tais bocas que cheiram a má noticia de jornal,
Que ainda escavam buraquinhos fictícios,
Malefícios pessoais.
São apenas ferrugentos tais olhos rabugentos que as rosas não vêm passar,
Não vêm caçar pensamentos alguns.
São bolas de pêlo andantes que não sabem porquê amantes,
Não sabem porque antes, e agora barulho fazem soar,
Entulho de se cheirar e escorregar em solo firme…





Miguel Ângelo

sexta-feira, janeiro 06, 2006



Debaixo da mesa lembrei-me que o sorriso é diferente. Depois fiquei cansado.
Doíam-me as unhas, e os riscos cravados nos pés de madeira faziam lembrar-me canções, canções que nas noites de fuga precisa o estômago fazia cantar.
Era cedo e eles lá vinham, as pernas que via dobradas rugiam ao dia com cheiros falantes. As pernas da ponta escorriam em pés, em dedos molhados no sangue das flores, eram facas cruéis à natureza pois.
As minhas amigas ás bolas pretinhas não fazem desenhos maldosos, desenham casinhas de palha debaixo dos pés deles. Hó, mas elas não param pra mim, dizem que o sonho se constrói e o tempo pode acabar.
Eu não me lembro do sonho da noite passada, mudaram a toalha e a renda roubou-mo...os sonhos também se roubam.
Dói-me o escuro dos olhos que aumenta...os barulhos do desempeçar da alcatifa dão-me tanto que sorrir. Eles ficaram sem pernas, sem joelhos, e depois sem pés, foi crescente a pisadela no tapete escadeado. Agora ficou escuro e pelinhos colorados voltam ao ponto de criação, e o preto dos olhos aumenta. (sorrisos serenos...)
Balancei-me no ritmo do ar. Vinha por aí dentro, e as flautas nasais faziam vibrar notinhas de cristal. As danças mais belas que o tempo já viu. Não acho que o tempo se acabe ao ver sonhos de papel voador.
É mais claro agora e já vejo teias maiores, são vestidos que crescem condicionados ao corpo do tempo.
Já tenho vestidos nos olhos, ai, hein, ain, ai...que embaraço, porque é que me tapam com vestidos dos outros?
Mas que passos marcados que me cansam ouvir. As pestanas reagem ao clicar do suporte, ups, que sininhos são estes que não vejo abanar? Hehehehe (reacções em pálpebras suaves. o Clicar de baixo com cima)
HHAAinn...os suores que tenho ao me ver cabisbaixo. São gotinhas de sonho que já começam a pesar, elas saem de escorrega até ao poço cansado... (sorriso de ceda)




*Despiram a mesa que tem pés de canção

Miguel Ângelo